ERA UMA VEZ O CINEMA


Furia (1936)

cover Furia

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País: USA, 92 minutos

Titulo Original: Fury

Diretor(s): Fritz Lang

Gênero(s): Crime, Drama, Filme-Noir, Suspense

Legendas: Português,Inglês, Espanhol

Tipo de Mídia: Cópia Digital

Tela: 16:9 Widescreen

Resolução: 1280 x 720, 1920 x 1080

Avaliação (IMDb):
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7.9/10 (10494 votos)

DOWNLOAD DO FILME E LEGENDA

PRÊMIOS star star star star star

National Board of Review, USA

National Film Preservation Board, USA

INDICAÇÕES star star star star star

Academia de Artes Cinematográficas de Hollywood, EUA

Oscar de melhor roteiro original (Norman Krasna)

New York Film Critics Circle Awards

Best Actor - Spencer Tracy

Best Film

Best Director - Fritz Lang

Sinopse: O filme conta a história de Joe Wilson (Spencer Tracy) e Katherine Grant (Sylvia Sidney), um jovem e humilde casal que passa um ano trabalhando em cidades diferentes juntando dinheiro para o seu casamento. Quando finalmente chega o tão aguardado dia do reencontro, algo inesperado acontece: Joe é parado no meio do caminho pela polícia e detido, confundido com o chefe de uma gangue de sequestradores, levado à delegacia e interrogado, mas se uma acusação formal imposta (como o próprio xerife coloca, ele era apenas suspeito).

O homem com o qual Joe foi confundido havia sequestrado e matado uma moça na pequena cidade, gerando comoção e ódio na população. E, quando um dos policiais escapa a informação de que eles poderiam ter capturado o tal bandido, os boatos começam a correr e, em pouco tempo, todos na cidade acreditam que Joe é mesmo o assassino, organizando um mutirão de linchamento rumo à cadeia.

Por mais que tente, o xerife não consegue acalmar a multidão que, em pouco tempo, rende os poucos policiais que ali estavam, invade a delegacia e, por fim, incendeia o prédio com Joe dentro. As chamas consomem o prédio e, após acompanharmos a passagem do tempo por recortes de jornais que estampam que um inocente havia sido queimado vivo por uma multidão de linchamento, a trama dá sua primeira grande virada: Joe aparece aos seus irmãos, vivo (apesar de algumas queimaduras pelo corpo) e completamente sedento por vingança, e os obriga a contratar um advogado para levar os que participaram de seu atentado ao tribunal e, por fim, à Pena Capital pelo seu suposto assassinato.

Em Fúria, podemos identificar dois caminhos tomados pelo diretor. O primeiro e, mais evidente no seu primeiro ato, é uma análise da sociedade americana, dos modos e costumes daquele que, agora, era seu povo. Tudo que ocorre na trilha de boatos, iniciada numa barbearia e findada num bar, quando são tomados por certeza absoluta, tem um tom de caricatura tão hilário quanto perverso, como a cena memorável em que são alternados planos de um grupo de senhoras à porta da igreja discutindo sobre o já provável assassino e um galinheiro cheio, bem semelhante à M – O Vampiro de Düsseldorf, quando a montagem alterna policiais e bandidos discutindo seus planos para apanhar o assassino de crianças (opostos que não deveriam, mas estão mais do que próximos).

Há também um certo interesse pessoal do diretor nessa análise de costumes, a exemplo da primeira discussão na barbearia, quando todos falam do “assassino”, tratando seus direitos com desdém, e um dos homens intervém: “Vocês nasceram aqui na América, não precisaram estudar a Constituição. Eu vim de fora e tive de ler tudo quanto pude para poder exigir algo”. Não fica difícil notar nesse personagem (que permanece menos de três minutos em cena e sem mais falas) um breve alter-ego de Lang, que buscava entender essa sociedade “nova” para, então, se entender nela (interesse que o próprio externou em outros momentos).

Em meio à compreensão, está a critica. E Lang, ainda recorrendo à caricatura, usa seus personagens para atacar as bases do Estado. O governador que nega o pedido de reforço do xerife pela Guarda Nacional por temer que seja visto como um “acolhedor de assassinos” (arriscando, inclusive, a vida de seus próprios policiais e condenando um inocente à morte), o juiz que diz que “participar de um tribunal de assassinato é indiscutivelmente a maior honra para um bom americano” e a mídia, mostrada no filme sempre à espreita da próxima notícia ruim, além da própria multidão que faz de um linchamento uma grande festa; todos parecem constatar o ideal americano como uma “cultura de morte”.

Mas impossível falar de Fúria sem remeter a seu posterior, Só se Vive Uma Vez. Além da trama praticamente idêntica (casal que tem seus planos frustrados por uma falsa acusação que leva o homem à cadeira e, após sua fuga, à busca da vingança) e da Sylvia Sidney repetindo o mesmo papel deste aqui, as questões abordadas são basicamente as mesmas (fugindo do esquema do tribunal e batendo um pouco mais na mídia).

Ambos os protagonistas vêm de fora e têm dificuldades em serem aceitos na nova comunidade, sofrendo com a resistência e o preconceito. Em Fúria isso é mais evidente. O provincianismo que impera entre os moradores da pequena cidade e os leva a mentir em pleno tribunal, tudo em nome da comunidade (um bem maior para eles), a faz um arqueótipo perfeito da sociedade americana “fechada” ao resto do mundo. Novamente tornando a Lang, os personagens de Spencer Tracy e Henry Fonda teriam muito do diretor.

Mas, apesar dessa tentativa de adaptação à nova pátria e, claro, a seu cinema, Fritz Lang não deixa de imprimir suas marcas. Ao inverter a trama, apresentando o “mocinho” vivo e agora desejando a morte de todos, mesmo que isso o custe passar o resto de seus dias escondido e sustentando a farsa de sua morte, Lang vai muito mais além de uma perspectiva social que teria se o foco do filme fosse apenas o linchamento, voltando as atenções ao desejo de vingança do protagonista e abordando um tema recorrente em sua filmografia: a análise da maldade humana. A barbárie dirigida contra Joe e a tal “cultura de morte” não se mostram apenas como um sintoma da sociedade corrompida, mas dos próprios homens e dessa fúria que carregam consigo. A certa altura do filme, já não há mais um herói ou vilões propriamente ditos; todos são vítimas de sua própria fúria

Os closes nos rostos dos linchadores assistindo ao prédio ser consumido pelas chamas e um olhar perverso de extremo prazer (as sombras em forte contraste com o reflexo do fogo brilhando em seus olhos – a força do Expressionismo Alemão mesmo no modo americano de se filmar) são a essência da obra: a fúria que serve de catalisador às transformações de vítimas em algozes e coloca carrascos frente ao cadafalso; é a roda que move a pequena cidade, a América e, bem além, os homens.

 

Elenco: